"Muitas vezes o desinteresse pela leitura está associado ao facto de o livro não ser um objecto afectivo para a criança. Sugerimos algumas práticas para fortalecer esse laço.
A imagem que se tinha do livro enquanto objecto persistiu, durante muitos anos, como algo de sagrado. Qual é o adulto que não se lembra da biblioteca da sua escola, com estantes fechadas a sete chaves e uma funcionária que se autoproclamava a rainha do espaço, obrigando a um silêncio profundo e quase votos eternos de extremo cuidado no manuseamento das preciosidades que se escondiam por trás das grelhas e que alguns jovens arrojados teimavam em alcançar com o olhar?
Ao longo das últimas décadas muito se tem lutado para alterar a ideia de que o livro é um objecto sagrado, nomeadamente com a revolução que se operou na Rede de Bibliotecas Públicas e Escolares.
Todavia, se a criança não contacta com o livro desde que nasce, a par de outros brinquedos, pode nunca ver o livro como um objecto igual aos outros: Para iniciar esta convivência, nada como deixar a criança morder o livro, abri-lo e fechá-lo, agarrá-lo e deitá-lo para longe.
Há boas opções de livros para bebés no mercado, com os cantos recortados, cartonados ou almofadados, que resistem bem a estas actividades.
O que é importante é ensinar a criança a respeitar o objecto livro como deve respeitar outros objectos, sejam brinquedos, vestuário, mobiliário, etc. O cuidado não ser condição do objecto e sim do cuidador, no caso a criança.
O Pequeno Inventor (Hyun Duk & Cho Mi-ae, Orfeu Negro) é um excelente exemplo das valências de um bom livro: a narrativa acompanha um menino que tenta construir um comboio. As ilustrações são de tal modo figurativas que a criança pode, ao ouvir a história, construir ela própria um comboio, ou vice-versa: usar as ilustrações do livro para construir o comboio e depois ficar curiosa para ouvir a história.
Mostrar livros pouco convencionais aos mais novos ajudará a que estes se afastem dos estereótipos e criem os seus próprios gostos e afectos. Uma última palavra para destacar três livros da Bruaá , cujas formas rompem com as ideias conservadoras e permitem a todos os públicos relerem com olhos muito mais atentos: Popville (Anouck Boisrobert e Loius Rigaud) é um pop up de uma cidade em construção, O Arenque Fumado (Charles Cros e André la Loba) é um poema que se desdobra e se pode pendurar na parede e, finalmente, Isto ou Aquilo (Dobroslav Foll) que cria duas figuras em cada imagem através de um efeito óptico. Ler é tudo isto."
Andreia Brites
via bruaá
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