Um pavão se admirava na beira do lago, se olhava na água e se perguntava:
- Sou feio? Sou bonito?
Quando via a cauda aberta em leque, toda verde, roxa e azul-brilhante, se achava lindo e elegante.
Mas quando olhava para os pés e seu andar desajeitado, ficava até desanimado. E se escondia envergonhado.
Um dia, ele recebeu um convite para uma festa no céu, que devia ser ainda mais bonita que a tal do sapo. Abriu e perguntou:
- Será que isso é bom? Será que é ruim?
Sempre que precisava ter uma opinião, ficava assim.
- Claro que é bom – disse o pombo-correio.
- Festa é sempre bom.
E ele achou que era bom.
Abriu a cauda e ficou se admirando. Depois, ensaiou uns passos de dança. E ouviu as gargalhadas de um tangará dançarino que, bem ao seu lado, treinava para a festança:
- Que bicho mais desajeitado! Este baile vai ser engraçado....
Ficou todo sem graça e se fechou.
Aí chegou um pardal e assim falou:
- Que tristeza é essa ?
- É que eu danço esquisito...
- E quem vai reparar nisso num bicho tão bonito?
E o pavão, elogiado, abriu a cauda com pena pra todo lado.
Mas, de mau jeito, acabou perdendo uma, lá no canto direito.
Foi uma tristeza danada. E lá ficou de novo, todo encolhido, de cara amarrada.
- Por que todo esse aborrecimento? – Perguntou o periquito, que passava nesse momento.
- Perdi uma pena e isso é ruim.
- Ruim uma ova. É sinal de que vai ganhar outra bem nova.
Com isso, o pavão se animou e abriu seu leque.
Aí chegou o bem-te-vi e riu muito engraçado:
- Olha o pavão de rabo banguela!
Já se sabe: o pavão encolheu a cauda, tratou de sumir com ela.
E ficou assim a tarde toda, abrindo e fechando, abrindo e fechando, mudando de idéia com cada bicho que ia encontrando.
No fim do dia estava suado, cansado, de língua de fora, exausto de abrir e fechar a toda hora.
Resolveu: não ia mais. Mas também não ficava ali para todo mundo rir dele. Viu uma moita e se escondeu atrás.
Aí ouviu uma conversa do outro lado:
- Nem agüento mais esperar o baile. Que festança vai ser essa...
- É mesmo! Comida boa, água fresquinha, muitos amigos e música à beça....
O pavão foi até lá, ver quem tinha tanta animação.
Não era pássaro colorido, nem dançarino, nem de boa canção.
Era um casal de urubus.
Foi a vez do pavão rir deles, abrindo suas penas verdes e azuis.
- Vocês não se envergonham? Feios assim e cheirando ruim? Quando vocês dançarem, todo mundo vai sair.
Vai nada... - respondeu o urubu.- Todo mundo está mais ocupado, tratando de comer e beber, de cantar e dançar, de se ver e conversar.
E se alguém quiser, pode rir.
Não é por isso que vou deixar de me divertir.
E a urubua completou:
- E tem mais: não tem essa de feio e fedorento, não, ouviu?
Urubu é tão bonito, da cor do jamelão e do jaguar, da jabuticaba e da noite sem luar....
E quando o pavão abria o bico e se espantava, ela continuou:
- Você é que é feioso, com esse rabo escandaloso, abrindo e fechando que nem gaveta. E nem ao menos tem a cor preta.
Todo esse verde, vermelho e azul, cheio de bolinha.....
Mas a última coisa que disse foi com um sorriso manhoso e olhar dengoso:
- O que vale é que você tem uns pés que são mesmo uma gracinha...... E depois, isso de bonito ou feio é só questão de recheio.
Aí o pavão teve que rir.
E depois que os dois saíram voando, ele ficou pensando:
- Feiúra de lixo ou beleza de artista não depende do bicho, mas do ponto de vista. Cada um é diferente e o que importa é mesmo a gente.
E lá foi ele animadíssimo para uma festa bem divertida.
Ainda bem. Se não, ficava naquele abre-e-fecha toda vida.
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