quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Palavras desenhadas


Ornitorrinco





ORNITORRINCO

Há bichos com mais sorte do que outros (ao que parece, a injustiça não olha a espécies). E o ornitorrinco é um deles: pertence a uma pequena elite de animais com nomes carismáticos. Podem não ser bonitos, mas a verdade é que a designação estilosa lhes dá charme suficiente para seduzir um zoo inteiro. Um nome com personalidade faz maravilhas.


O ornitorrinco é assim o equivalente ao Gainsbourg do reino animal. E não me refiro à voz nem às orelhas, mas à pinta. Basta apresentar-se pelo nome e as fêmeas caem-lhes aos pés como tordos. Nunca falha.

A técnica também resulta bem com humanos: eu sou a prova viva disso – fiquei completamente rendida à palavra ornitorrinco, foi amor à primeira audição – e algo me diz que há por aí mais pessoas com uma queda especial para bicharada de nomes patuscos. Gente que era capaz de levar um para casa só pelo prazer de poder dizer em voz alta: “Tenho um ornitorrinco, uma suricata, um guaxinim, um pintarroxo, um ratel.”

No caso do ornitorrinco, o aspecto consegue ser ainda mais insólito do que o nome. A sua bizarra fisionomia parece o resultado daqueles livros infantis em que se criam animais juntando uma parte de três bichos diferentes e o conjunto revela uma criatura estrambólica qualquer, que só existe mesmo na imaginação de quem a inventa.

A avaliar pela aparência, o ornitorrinco tinha tudo para ser um animal mitológico – ora vejam: corpo de castor, bico de pato e garras de urso. E ainda dizem que a realidade não supera a ficção. Pensando bem, devia era chamar-se caspaturso. Ah, mas depois já não era uma palavra de que eu gosto. Deixa cá ver… caspaturso… caspaturso… Bem, e daí, talvez até fosse.













































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